De volta para casa, de Karen White
E se de repente você parasse e percebesse que sua vida teve um hiato de 15 anos?
Na verdade, não exatamente um espaço em branco, mas como se todo esse tempo não significasse quase nada, a não ser uma época cinza, de tristeza e raiva pelo que sua irmã mais nova fez e não consegue perdoá-la, afinal, o perdão de uma traição é muito difícil, principalmente se essa infidelidade tenha vindo de duas pessoas que se ama.
Em De volta para casa (Editora Novo Conceito, 448 páginas), de Karen White, Cassie passa pelo trauma de ter seu namorado roubado pela irmã, por isso muda, ou foge, para Nova Iorque e durante 15 anos não volta para casa. Nesse tempo, se encontra com o pai algumas vezes, longe da antiga cidade e ele conta como estão todos e entrega fotos de seus sobrinhos. Mas agora, como um autodesafio precisa voltar, pois ele está muito doente e deseja revê-la antes de partir.
Então conversa com o namorado, com quem mora, e diz que deve ir logo. Andrew se mostra frio e somente preocupado com os dias em que ela faltará ao trabalho. Ele aparece pouco na história, mas dá para perceber, em suas ligações, que não se importa com nada além de si mesmo. Como quando Cassie está triste com a perda do pai, Andrew pede que ela volte logo para fechar um grande negócio. Nunca pergunta como ela está, ou se precisa de algo. Até mesmo para ceder seu carro para a ida até Walton, na Geórgia, ele hesita, mas acaba aceitando.
Em sua terra natal, Cassie reencontra toda a sua vida, a verdadeira, a que abandonou para fugir de todos e dela mesma. Ainda que diga que era por um sonho. Lá, encontra seus amigos de escola, vizinhos e sua irmã, o marido e cinco filhos – a mais velha, Maddie, de 14 anos, é muito parecida com a tia, fisicamente e em temperamento, que só viu a sobrinha por fotos. As duas se tornam bastante amigas.
Reviver o passado é complicado quando se passa por uma dor tão grande e que a distância e a saudade deixaram ainda maior. Mas se Cassie tivesse resolvido e não fugido, não precisaria passar por tantos momentos desagradáveis – ou que ela os toma desta forma por ser mais fácil.
Ela encontra o pai e ele aguenta pouco tempo, somente o necessário para ver finalmente suas filhas juntas. Quando ele morre, as duas começam a se reaproximar lentamente, com aquele medo de dar espaço a outra. Harriet tenta mais, mas encontra uma barreira de ressentimento.
A passagem da morte é muito rápida, quase não há um sentimento pela perda. A história fica em torno da vida dos moradores do local e da casa – que Cassie herdou – e a tentativa de venda. Ela quer permanecer na cidade até passar para alguém que saiba que não vai mudá-la, transformá-la em algo que mude a rotina da pequena cidade. Enquanto isso Andrew liga para cobrar sua volta. Enfim Cassie percebe – o que o leitor já percebeu há muito tempo – que ambos não sentem tanta falta um do outro. O que dá a entender é que eles são práticos e querem permanecer juntos por conta da vida que já montaram, mesmo que o amor não seja tão intenso, ou nem ao menos exista. Essa é uma ideia comum, muitos casais se acostumam com a vida que levam e depois um machuca o outro muitas vezes sem intenção de fazê-lo. Ou falta o tempero do interior nesse romance frio.
Mas Cassie é bem cabeça dura, tem sua vida – que julga ser ótima – em Nova Iorque, não aceita ter que ficar mais tempo na cidade, ter que conviver com pessoas tomando conta de sua vida – o que acontece em cidades pequenas, em que todos se conhecem e se ajudam – como Sam, um antigo colega que ela quase nem prestava atenção, e que mudou muito, se tornou médico, e uma pessoa sempre presente para levá-la aonde quiser. Às vezes parece que ele não tem muito que fazer por ali.
Assim, De volta para casa trata de temas fortes, como abandono de si, traição, família, de passado não resolvido que atrapalha o presente, pois faz com que fique sendo remoído enquanto não há uma conversa definitiva. Também há reencontros, amores e amizades.
Tirando a parte da revisão que pecou um pouco – há tantas partes “sorriso no rosto”, “piscou os olhos”, e outros erros que me incomodaram –, posso dizer que chorei ao ler o livro, tem partes tão intensas que dão vida aos personagens. Parece que são amigos reais. Em vários momentos, enquanto não estava lendo, me pegava pensando em cada um, como ajudá-los, fazer Cassie enxergar a vida… Enfim, De volta para casa é uma ótima leitura.