Resenha

Resenha: A Praga escarlate, de Jack London

Além da Praga que tomou conta do mundo, esta história mostra o declínio da linguagem. E se faz tão atual nos dois pontos…

Nessa distopia que se passa em 2073, uma epidemia vermelha, através de germes, que devastou tudo e mostrou o que somos: seres inferiores. Lembro-me de uma parte interessante de “A Guerra dos Mundos” (1898), de H. G. Wells (1866-1946), na qual os alienígenas subestimaram nosso pequeno mundo verde.

A história de “A Praga Escarlate”, de 1912 (Editora Conrad, 104 páginas), de Jack London (1876-1916), começa mostrando um pedacinho do mundo e de como ele está, duas pessoas caminham pelos trilhos de trem. Mas já não há trens e pouco resta dos trilhos. A Natureza tomou conta de tudo, ou melhor, tomou de volta o espaço que lhe pertence.

Essas pessoas são o avô, bastante velho, e o neto. Vestem-se com peles de animais.

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Aos poucos, descobrimos, através da curiosidade do menino e das histórias do passado do avô, o que se deu para o mundo estar daquela forma. Por exemplo, quando veem um urso do outro lado da linha férrea e o avô diz que antigamente tinham que pagar para verem esses animais.

Edwin questiona o que é dinheiro, mas logo se lembra e pega uma moeda antiga, datada de 2012 (dez anos depois da previsão, ainda estamos aqui, senhor London, mas não sei por quanto tempo aguentaremos. Tanto pela pandemia quanto pela linguagem).

Bem, através dessa data o avô conta que a Praga Escarlate veio em 2013 e que se passaram sessenta anos desde então. Vemos que os jovens continuam cada vez mais sem paciência para as histórias dos mais velhos. Edwin pergunta por que o avô “fala tanta coisa que não faz sentido nenhum”.

Acontece que o avô ainda se lembra de algumas palavras antigas, quando começa a contar suas histórias passa a recordar o inglês correto. Há de se entender que conforme o mundo evolui, a linguagem também se modifica (serei mais justa e menos agradável aqui: a linguagem empobrece, vide como lidam hoje com ela na era da internet. A forma como querem impor certas utilizações sem qualquer sentido e, também, limitações, como letras minúsculas em início de frases, falta de pontuação e muitas outras decadências). Um bom exemplo de livro que trata da questão é o visionário “1984” (1949), de George Orwell (1903-1950).

“Falavam por monossílabos e frases entrecortadas, mais um amontoado de palavras do que propriamente uma linguagem. Ainda assim, era possível divisar sinais de construção gramatical e vestígios de conjugação de uma cultura superior. Mesmo o linguajar do velho era tão deturpado que, se fosse escrito literalmente, quase não faria sentido para quem lesse.”

Bem, os meninos são selvagens, maldosos e riem do sofrimento do avô ao lhe pregar peças, como jogar areia nos mexilhões sem que o homem perceba, e, como não tem dentes, se machuca.

O que resta da humanidade regride.

“Vocês são verdadeiros selvagens! Já começou o costume de usar dente humano como enfeite. (…) A espécie humana está fadada a se arrastar de volta à noite primitiva para que, só então, recomece a escalada rumo à civilização.”

O velho olha o mar e se recorda de uma São Francisco cheia de gente, de vida. Ele começa a contar a história da Praga Escarlate e logo descobrimos o motivo pelo qual ele fala tão bem, seu nome e a sua idade: 87 anos.

Jack London consegue mostrar o lado perverso da vida, seja ela vinda de um lobo ou de um humano. Mas apenas o humano comete maldades por prazer.

Essa história não tem como não comparar com o que estamos vivendo desde 2020. Assim como hoje, vemos que o ser humano está regredindo em pensamentos e atitudes.

“Londres (…) vinha combatendo a epidemia em segredo havia duas semanas, e vetando a divulgação.”

E ao assistirmos aos noticiários percebemos como essa maldade extrema cresce cada dia mais na sociedade. A regressão está mais presente, o desespero e o medo tomam conta das pessoas. Tivemos uma pandemia (ainda está aqui) que ajudou a mostrar o egoísmo e aflorou a maldade.

“Todo o trabalho duro do homem sobre a Terra não passou de espuma.”

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